domingo, setembro 11, 2005

A luta pela esperança

Em 2001, o diretor Ron Howard se juntou ao ator Russel Crowe, ao roteirista Akiva Goldsman e ao produtor Brian Grazer para levar às telas a história do matemático esquizofrênico John Nash em Uma mente brilhante. O filme recebeu 4 oscars em 2002, entre eles os de melhor diretor e melhor filme, e outras 4 indicações. Recentemente, o grupo repetiu a parceria para levar aos cinemas outra cinebiografia, com um estilo bem parecido ao da anterior. A luta pela esperança (Cinderella Man, EUA, 2005) traz Crowe no papel do pugilista James J. Braddock, um nome em ascensão no boxe em fins dos anos 20, mas que devido a uma derrota vê sua promissora carreira destruída e acaba na miséria com a mulher (interpretada por Renée Zellweger) e os filhos durante os anos da grande depressão. Após muitas derrotas sucessivas, que custaram sua licença na liga de pugilismo, Braddock sobe novamente ao rinque, em clara desvantagem, para lutar contra um peso-pesado e, inesperadamente, vence a disputa.
Trazendo uma premissa dessas fica difícil compreender porque o filme não foi bem nas bilheterias ianques, a ponto de a rede de cinemas AMC ter criado uma promoção que devolvia ao espectador não satisfeito o dinheiro de seu ingresso. O público norte-americano adora histórias que mostrem o sofrimento e o pessimismo de seu povo durante os anos que se seguiram à queda da bolsa de Nova York, em 1929, e como a projeção de uma figura edificante representava a retomada da esperança de toda uma nação. Vide Seabiscuit, que acabou concorrendo ao oscar de melhor filme em 2004. Pois é exatamente nesse contexto que o novo filme de Ron Howard entra para jogar sua moral: a possibilidade de uma segunda chance. Mais uma vez o grande vilão da história é o desemprego, razão maior de toda a miséria e das adversidades sofridas pelos cidadãos norte-americanos. E mais uma vez uma figura simbólica se destaca para mostrar aos seus compatriotas que a vitória é possível, mesmo que nada esteja a seu favor.
A luta pela esperança é politicamente correto ao extremo. Não tem nada de inovador ou arriscado. Ao contrário: as opções que o roteirista e o diretor fazem para construir a história colocam-na dentro dos padrões oscarizáveis da Academia. No entanto, o filme tem seus méritos, que se sobressaem mais pela qualidade do que pela quantidade. Os mais valiosos deles são as atuações de Russel Crowe e Paul Giamatti, como o empresário do lutador. A dupla tem uma boa química e suas interpretações fortes e comoventes vão além do texto. Em muitos momentos os dois atores mostram que, assim como Jim Braddock era um herói para o povo americano, eles são os heróis para o filme de Howard, sendo capazes de tornar seus papéis mais complexos e verossímeis do que o roteiro parece às vezes intecionar. Crowe acresenta ao seu personagem um brilho incontido nos olhos quando sobe em um ringue, evidenciando ao público que, mais do que um meio de melhorar a vida da família, o boxe era para ele uma vocação, na qual seu empresário acreditava piamente.
Não há como negar que Ron Howard consegue em geral extrair da platéia aquilo que deseja. As cenas do filme são bem construídas para provocarem no espectador as sensações de comoção ou de tensão almejadas. Em boa parte da projeção, o diretor até que resiste às tentações de cair em certos clichês que a história convida. E é frustrante observar os momentos em que ele sucumbe a elas. O mais fatal deles é quando, no meio de uma luta difícil, Braddock, quase no fim de suas forças, relembra em um flash back os períodos de dificuldade de sua família, ganha motivação e consegue vencer o adversário. Mas é bom perceber que, depois desse deslize, o filme não deixa escapar sua nova chance e começa a direcionar as atenções do público para a última e mais difícil das lutas. Ao contrário das anteriores, a cena da disputa final não tem tantos cortes e câmera rápida. Mantém os planos subjetivos, mas é mais longa e angustia o espectador a ponto de fazê-lo torcer desesperadamente pelo clássico final hollywoodiano. A fotografia do filme chama a atenção por ser extremamente escura, clareando de repente quando a história está a ponto de oferecer a Braddock sua segunda chance. Mesmo assim, em grande parte das cenas, sobretudo nas internas, os personagens são vistos em meio à escuridão. A luz é quase pontual, em tom amarelo-avermelhado, e provêm de pequenos focos no cenário, como abajures ou velas.
Para quem não é muito fã de Uma mente brilhante e, ainda que bastante premiado, considerou-o muito barulho por pouco, confira a A luta pela esperança. Apesar de não ter feito tanto barulho, com seus erros e acertos o filme acaba sendo, sim, alguma coisa.

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