domingo, maio 21, 2006

O Código Da Vinci

Jesus Cristo teria se casado com Maria Madalena e gerado descendentes? O Santo Graal, representação máxima do poder da Igreja na Terra, seria uma referência a essa descendência e não um cálice sagrado? Os códigos humanistas inseridos nas pinturas de Leonardo Da Vinci revelariam um segredo que a Igreja Católica protegeu por séculos? Dan Brown, autor do best seller mais comentado dos últimos tempos, teria roubado a teoria de outros estudiosos para criar a trama de O Código Da Vinci? Até aqui, apenas especulações. Acredita-se no que quiser. Vamos aos fatos e aos números. É certo que o romance de Brown vendeu 49 milhões de cópias e despertou reações infladas da Igreja Católica em todo o mundo, e no Brasil não foi diferente. E é óbvio que Hollywood não perderia a chance de transformar tanta polêmica em bilheteria e dinheiro. Impulsionado pela popularidade do livro, pegando carona na publicidade antecipada e gratuita, o projeto de 125 milhões de dólares foi levado à frente pelo produtor Brian Grazer, o diretor Ron Howard e o roteirista Akiva Goldsman. O trio oscarizado por Uma mente Brilhante havia ainda trabalhado junto em A Luta pela Esperança, mas dessa vez se separou do companheiro Russel Crowe para guiar Tom Hanks na adaptação de O Código (The Da Vinci Code, Estados Unidos, 2006) das páginas do livro para a tela de cinema. Hanks não é exatamente o que se chamaria de “Harrison Ford num terno da Harris Tweed Shop”, como seu personagem, Robert Langdon, é descrito no romance, mas mantém a pose nessa aventura de suspense acompanhado por um time estrelar. Audrey Tautou (que nem de longe lembra Amèlie Polain), Jean Reno, Sir Ian McKellen, Alfred Molina e Paul Bettany são alguns dos bons nomes que encabeçam o elenco.
Confesso que nunca tive muito interesse em ler o best seller de Dan Brown e, portanto, apesar de já ter ouvido antes as teorias exploradas pela trama, que são mais antigas do que a polêmica gerada pelo pai de Robert Langdon, a história me foi apresentada pela primeira vez através do filme de Ron Howard. Assim, minha análise do longa passará longe de questões problemáticas do tipo “O filme foi uma boa adaptação do livro?”, ou “O livro é bom”? A estrutura narrativa do suspense, no cinema e na literatura, mostra muitos traços comuns. O noir, grande reduto do gênero, que teve seu auge no cinema durante a década de 1950, descendeu da literatura de mesmo nome, mais antiga. Durante toda a historia que se seguiu, os dois formatos coexistiram e dialogaram. Como é de praxe, o herói aqui se vê envolvido em uma trama mirabolante, ao lado de uma mulher bonita, corajosa, forte e inteligente como ele, que precisa de proteção. Eles formam uma boa dupla e a atração que surge é inevitável, mas a paixão não vai além de uma tensão sugerida. O herói salva a moça, permitindo que ela encontre sua redenção. E, com o fim do mistério que os mantinha ligados, o casal fatalmente se separa.
Jacques Saunière, curador do museu do Louvre, é assassinado na noite em que iria se encontrar com Robert Langdon. Antes de morrer, o velho homem, membro importante do Priorado de Sião - sociedade secreta que protege há séculos um segredo capaz de mudar a história da humanidade - deixa na cena do crime insígnias que somente Langdon poderia decifrar. O professor mestre em simbologia torna-se o principal suspeito do crime. Perseguido pelo capitão da polícia francesa Bezu Fache (Reno) e por Silas (Bettany), um monge albino fanático a mando da Opus Dei, Langdon começa a seguir a trilha de códigos sugerida por Saunière, ao lado de Sophie Neveu (Tautou), criptógrafa do governo francês e neta da vítima.
A historia criada por Dan Brown traz um mínimo de verossimilhança. Embora o autor afirme que se baseou em pesquisas e fatos reais para desenvolver seu enredo, especialistas apontam uma série de erros na obra e um sem número de publicações entrou na dança tentando tirar proveito do sucesso enorme do livro que cutucou o cristianismo. Mas é sempre bom ter em mente que, polêmicas à parte, o O Código Da Vinci é uma obra de ficção, que usa as teorias provocativas à fé católica como um pano de fundo para sua teia de suspense.
O Código Da Vinci é um produto vendável, destinado ao grande público. E o será em qualquer formato que se encaixar, em papel ou em película, porque suas pretensões não vão além disso. O livro não deve ser mais do que o esperado de um bom best seller de suspense. O filme não é mais do que o esperado de uma superprodução eficiente. Ron Howard é reconhecidamente um diretor limitado. Dá conta da história, mas para narrá-la lança mão de uma série de saídas fáceis. Em O Código, não é diferente. Howard faz um uso excessivo de flash backs, a maneira mais simples – e, por que não dizer, simplória – de explicar a trama. Como é de seu feitio habitual, a música óbvia acompanha em crescendo os momentos de tensão e em instante algum consegue surpreender. À receita, misturam-se ainda inevitáveis cenas de ação para despertar a platéia e frases de efeito rasíssimas. Esses são apenas alguns dos muitos clichês que o diretor não se intimida em explorar. Em suma, Howard faz seu serviço, mas continua com preguiça de ousar. Visualizado por um outro diretor ou por uma outra equipe, o filme poderia talvez mostrar mais do que mostra pelos olhos de Ron Howard.
Tom Hanks não faz feio como o herói da trama. Ao contrário, sua presença é discreta, contida e até charmosa. Audrey Tautou garante personalidade à principal personagem feminina da história, uma qualidade interessante e de valor inestimável para o papel. O elenco coadjuvante tem peso. Tratam-se de atores sérios, capazes de conferir profundidade a qualquer papel que interpretem. É uma pena que o filme, talvez por obra da montagem, não abra mais espaço a suas participações. O Bezu Fache de Jean Reno, por exemplo, ganha contornos rasos demais, um desperdício para um ator desse porte.
As maiores estrelas do filme são as locações, grandes responsáveis pela gravidade e o charme do longa. O aval para filmar no Museu do Louvre, em Paris, Temple Church, em Londres, e Rosslyn Chapel, em Edimburgo, foram uma verdadeira benção à produção. Os cenários contextualizam a trama, enchem os olhos e emprestam um rebuscamento que, mais do que um belo luxo, mostra-se um fator essencial à história. A Abadia de Westminster precisou ser “dublada”. Sem a permissão para que fossem gravadas imagens em seu interior, a catedral de Lincolnshire fez as vezes do templo oficial das cerimônias religiosas da família real britânica, que foi filmada apenas por fora.
O Código da Vinci, o filme, é eficiente. Em grande parte, consegue envolver a platéia em suas reviravoltas, como um bom entretenimento. Tem um enredo interessante e eficaz, que cumpre aquilo que se presta a fazer. Competente. E não mais que isso. Hollywood, no sentido mais puro e simples do termo.

8 Comentários:

Às 6:20 PM , Blogger Marcela Bertoletti disse...

Eu ja imaginava que o filme seria cheio de cliches e coisas de hollywood. Mas eh uma pena saber que tao bons atores sao desperdiçados, num filme com eleco, no minimo, maravilhoso. Bom, como nao vi o filme ainda nao tenho uma opinião, mas imagino q ele seja exatamente assim e eh uma pena.

Q bom q vc atualizou o blog!

:)
Bjim

 
Às 10:57 PM , Blogger Isabella Goulart disse...

Incrível o quanto a minha crítica de V de Vingança se parece com a de O Código Da Vinci. Não sei se isso é bom ou mal, se é culpa da minha obcessão por noir e das expressões que costumo usar quando escrevo, ou se a culpa é de Hollywood.
=P

 
Às 12:40 AM , Blogger Arthur Protasio disse...

Culpar Hollywood nunca é dificil, afinal ela não se preocupa em mudar. No entanto mudar clichés que funcionam também não soam como uma idéia exatamente lucrativa então o paradigma permanece.
Ainda naõ vi o filme, mas pretendo vê-lo. Não li o livro e por esse motivo não acredito que o filme vá estragar qualquer experiência anterior. Lio Anjos e Demônios e gostei muito desse, mas estou quase certo que não haverá filme sobre esse.
Agora vou para o cinema calmo sem me preocupar com a fidelidade de uma adaptação, afinal li que o não necessário compromisso com a fidelidade é um dos princípios da adaptação. Sem mais, continue nessa sua jornada da escrita que tem meu total apoio. Somos dois. ^^

 
Às 7:15 PM , Anonymous Anônimo disse...

Sei que nossa ilustre crítica fez um texto isento pois não leu o romance original, mas queria falar um pouco sobre minhas impressões fazenda essa comparação inevitável.
Bom, como alguns já sabem, eu li o livro e não gostei. Tem coisas muito interessantes, mas no geral, não há um desenvolvimento maior da história e dos personagens.
O filme passa por cima de alguns bons momentos do livro mas, por outro lado, tira alguns excessos de Dan Brown e agiliza certos clichés que levam páginas para serem solucionados. E acrescenta, na minha humilide opinião, mais profundidade ao protagonista, Robert Langdon, em grande parte devido a Tom Hanks e ao roteirista). Acho que o casal de mocinhos funciona melhor no filme, eles convencem, ao contrário do livro. Principalmente na parte final. Achei o final do filme melhor que o do livro, mais emocionante, menos forçado. No livro, Brown chega a um final cansativo que não corresponde a tudo aquilo que ele tenta construir durante toda a trama. No filme o final é como tem que ser, aquilo que se espera e ainda é mais charmoso e grandioso.
Bom, sei que os fãs do livro vão querer me crucificar (sem piadinhas), mas essa foi a minha opinião.

 
Às 11:59 PM , Blogger Dennis. disse...

olha, eu não leio textos grandes no computador. o seu caso não foi exceção (desculpa, é política da casa). mas enfim, não gostei mesmo. to pra escrever um texto não sobre o filme, mas sobre as duas maiores fraudes q eu vejo no mundo hoje, e que se encontram majestosamente no filme. espere.

 
Às 4:32 PM , Blogger Isabella Goulart disse...

Sinto medo.
Do Dennis e do texto que está por vir. O que é, vai revelar os verdadeiros segredos que podem abalar a história da civilização cristã-ocidental???

 
Às 10:26 AM , Anonymous Anônimo disse...

Demorei mas voltei! A impressâo que tive foi de que o filme foi feito para quem leu o livro. Vc nâo ficou meio perdida em algumas cenas não? Foi um bom resumo do livro, não deixou nenhuma parte importante de fora, mas alteraram desnecessariamente algumas cenas. E pensei que iria ser mais polêmico. E cadê o comentário do filme O Clube da Felicidade e da Sorte que te pedi com tanto carinho? Ah, assisti Paradise Now e não achei nada excepcional como foi colocado pela crítica. E hoje é sexta-feira dia 26 de Maio! Adivinhe aonde estarei mais tarde? Bjs.

 
Às 5:42 PM , Blogger Isabella Goulart disse...

Onde estaremos! Ingresso já comprado e crítica de X-MEN3 em breve, nesse blog.
=]

 

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