terça-feira, fevereiro 27, 2007

Ele, o Oscar


Este foi um ano acanhado, mas relevante nas indicações e na premiação da Academia. O Oscar verde de Al Gore e Leonardo DiCaprio. O Oscar da diversidade para a qual a apresentadora Ellen DeGeneres chamou a atenção. Uma festa insossa na 79ª edição dos prêmios da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Los Angeles.
A aparente injustiça de nunca terem premiado Martin Scorcese mostrava sinais de que seria corrigida. Babel, o vencedor do Globo de Ouro por melhor filme de drama, apontado como favorito, levou baldes de água-fria nas premiações anteriores ao Oscar, sugerindo que em 2007 o favoritismo seria menos certo do que as surpresas. Os sindicatos, bons termômetros para a premiação da Academia, preteriram o Babel de Alejandro Gonzáles Inãrritu, dando crédito a Os Infiltrados de Martin Scorcese e confirmando o adorado – e adorável – Pequena Miss Sunshine como o queridinho de 2006. Com seu porte tímido, o filme da dupla Jonathan Dayton e Valerie Ferris – o único dos concorrentes de melhor filme a não ter os diretores indicados – levou o prêmio do sindicato de atores por melhor elenco, o do sindicato de roteiristas por melhor roteiro original e o do sindicato dos produtores, garantindo ser um competidor forte na briga pela mais importante das estatuetas douradas. O filme de Scorcese acumulou os prêmios do sindicato de diretores, do de roteiristas – melhor roteiro adaptado – e dividiu com Babel o prêmio do sindicato de montadores, chamando a atenção para mais uma possível surpresa no Oscar.
Ao todo, foram 14 indicações para filmes de veia latino-americana, muitas delas em categorias técnicas importantes: 5 para o mexicano O Labirinto do Fauno, de Guillermo Del Toro, 2 para Filhos da Esperança, dirigido pelo também mexicano Alfonso Cuarón e 7 para Babel, dirigido pelo não menos mexicano Iñarritu. Pedro Almodóvar viu Penélope Cruz, a estrela do espanhol Volver, ser indicada a melhor atriz, algo raro de acontecer a um filme falado em língua não-inglesa. A Rainha, tão polido e britânico quanto Sua Majestade, foi indicado a 5 prêmios. E o “sabe-se-lá-por-quê” queridinho da América Dreamgirls, o mais nomeado, com 8 indicações, arrematou apenas 2 estatuetas.
Acho que o Oscar 2007 ficará na memória por uma estimativa agradável: em que outro ano filmes além dos domínios norte-americanos ocuparam tanto espaço na premiação? No fim de tudo, o que mais me impressionou foi ter me surpreendido menos do que a maioria. Numa premiação imprevisível, possivelmente uma das mais competitivas em anos, os sindicatos indicaram o caminho dos garotos dourados, rebaixando a euforia de favoritismos a especulações vazias.

Como de praxe, as estatuetas mais esperadas da noite foram as últimas: melhor ator, atriz, diretor e filme, em sequência. O incomum foi apresentarem tantas categorias técnicas antes e entre os prêmios para as performances dos coadjuvantes. O primeiro prêmio foi para a melhor direção de arte, categoria em que O Labirinto do Fauno concorria com Dreamgirls, O Bom Pastor, Piratas do Caribe – O Baú da Morte e O Grande Truque. O Fauno havia levado o prêmio do sindicato pelos cenários que materializam a fantasia. Era possível que também abocanhasse o prêmio da Academia, ainda que se acreditasse no favoritismo de Dreamgirls. John Myhre – já oscarizado por Chicago e Memórias de uma Gueixa – e Nancy Haigh respondem por um ótimo trabalho no musical de Bill Condon, mas os méritos da direção de arte de Dreamgirls não chegam a merecer o Oscar. Minha aposta foi para Eugenio Caballero e Pillar Revuelta, que deram ao filme de Guillermo del Toro seu primeiro garoto dourado.
Competindo com o Apocalypto de Mel Gibson e com Click, O Labirinto do Fauno era também minha aposta para o prêmio de melhor maquiagem. Embora eu não tenha visto nenhum dos três concorrentes, me pareceu que no filme mexicano a maquiagem era um elemento essencial da direção de arte. Um Oscar poderia levar ao outro e o Fauno recebeu sua segunda consagração, para David Martí e Montse Ribé.
Dreamgirls se destacava novamente como favorito para melhor figurino. O trabalho de Sharen Davis é competente e dá um ar contemporâneo à década de 60. Mas, assim como a direção de arte, merece elogios, não a estatueta. O sindicato surpreendeu, preferindo A Maldição da Flor Dourada e A Rainha. Ainda assim, minha aposta era na veterana Milena Canonero, já premiada duas vezes pela Academia, que concorria por Maria Antonieta e levou o Oscar por um trabalho que exigiu ousadia e pompa – bem do jeito que a Academia gosta.



Duas das maiores surpresas, para mim, foram o Labirinto do Fauno ter levado melhor fotografia (Guillermo Navarro) – que, eu acreditava, iria para o trabalho excelente (e reconhecido pelo sindicato) de Emanuel Lubezki em Filhos da Esperança, um filme tecnicamente complicado e repleto de planos sequência – mas, mesmo depois de aclamado por três prêmios técnicos, perder para o alemão A Vida dos Outros o Oscar de melhor filme em língua estrangeira. Happy Feet também surpreendeu, levando o prêmio de melhor longa de animação que parecia ser de Carros. Os pinguins dançarinos de George Miller são mesmo superiores aos automóveis de John Lasseter.




O prêmio de efeitos visuais para John Knoll, Hal T. Hickel, Charles Gibson e Allen Hall por Piratas do Caribe – O Baú da Morte, contra Poseidon e Superman Returns, não surpreendeu. Melhor roteiro adaptado e melhor roteiro original também seguiram o previsto sem decepcionar. William Monahan, que elaborou a história precisa e ágil de Os Infiltrados a partir do roteiro de um filme chinês, venceu o primeiro. E Michael Arndt levou o segundo por sua crítica bem-humorada à família de classe-média norte-americana em Pequena Miss Sunshine, um roteiro delicado e agradável, recusado pelos grandes estúdios, que conquistou como filme independente.
No Oscar verde, anti-poluição ambiental, anti-desperdício e, aparentemente, anti-republicano, Al Gore foi celebridade. Aplaudido com entusiasmo por Leonardo DiCaprio e pela platéia ao pisar no palco do Kodak Theatre, sorridente e confortável o suficiente para ouvir e fazer piadinhas, o ex-quase presidente foi estrela na 79ª edição do Oscar. Era certo que ele levaria para casa a estatueta pelo documentário de longa-metragem Uma Verdade Inconveniente. E, com tanta hospitalidade, também não era difícil imaginar que a canção do filme, “I Need to Wake Up”, de Melissa Etheridge, com sua mensagem moral passasse por cima das três concorrentes de Dreamgirls (esgoeladas por Jennifer Hudson, Beyoncé Knowless e Anika Noni Rose) e de “Our Town”, composição de Randy Newman para Carros. Oscar de melhor canção para um filme documentário? Enfim, era o documentário do Al Gore.
Eu apostava no filme de Iñarritu para melhor trilha sonora e edição. A trilha, dilacerante, arrematou o prêmio e Gustavo Santaolalla, que já havia vencido o ano passado por O Segredo de Brokeback Mountain, derrotou Thomas Newman (The Good German), Philip Glass (Notas sobre um Escândalo), Javier Navarrete (O Labirinto do Fauno), Alexandre Desplat (A Rainha) e ganhou seu segundo Oscar. Mas Babel perdeu a estatueta de melhor edição para Os Infiltrados – minha primeira opção nas apostas, que acabei rebaixando a segunda – e Thelma Schoonmaker, parceira habitual de Martin Scorcese, ganhou o Oscar por um trabalho valoroso.






Cartas de Iwo Jima, mais um drama dirigido pelo durão Clint Eastwood, foi minha primeira aposta para melhor edição de som. Achei um filme absolutamente maravilhoso. Iwo Jima era minha paixão no Oscar desse ano e porque minhas apostas costumam ser influenciadas pela emoção, troquei meu voto para A Conquista da Honra, o similar oposto de Iwo Jima, também dirigido por Eastwood e rodado simultaneamente ao outro. Cartas... é um filme superior, mais seguro e bem construído, mas as semelhanças técnicas entre os dois são enormes. Na última hora mudei de novo o voto, dessa vez para Piratas do Caribe – O Baú da Morte, pelo ótimo trabalho de som realizado por Christopher Boyes e George Watters. E o Oscar acabou sendo dado a Alan Robert Murray – que concorria pelos dois filmes de Eastwood – por Cartas de Iwo Jima. Para mixagem de som, as apostas eram no favorito Dreamgirls. O filme em si é fraco, mas a mixagem de Michael Minkler, Bob Beemer e Willie Burton merece o prêmio que levou.

Falando em prêmios merecidos, vamos ao Oscar menos justificável da noite: o de melhor atriz coadjuvante para Jennifer Hudson. Sim, era uma barbada, ainda que alguns acreditassem que a pequena miss sunshine Abigail Breslin pudesse ganhar. Apesar do favoritismo, eu não acreditava que o musical fosse levar os dois Oscars de coadjuvante, mas estava em dúvida de quem ficaria na berlinda, a “injustiçada” do American Idol Jennifer Hudson ou Eddie Murphy. Dreamgirls é sofrível, roteiro e direção são medíocres e, embora as atuações não sejam ruins, elas também não são memoráveis. Jennifer Hudson é boa o suficiente para o papel, mas seu desempenho não valia um Oscar. Particularmente, eu preferia Adriana Barraza ou mesmo Rinko Kikuchi, ótimas em Babel. Eddie Murphy desenvolveu um trabalho realmente bom como Jimmy Early e seu personagem no filme cresceu porque ele é, de longe, a melhor coisa de Dreamgirls, um alívio para o filme. Dizem que a Academia não simpatiza muito com Murphy e ele não era, na minha opinião, mais merecedor do prêmio de coadjuvante masculino do que os outros concorrentes, todos donos de excelentes atuações. Venceu o veterano Alan Arkin, de Pequena Miss Sunshine.




Melhor atriz, melhor ator e melhor diretor eram barbadas das mais certas. A Rainha se ergue sobre o comedimento de Hellen Mirren e ela venceu Penélope Cruz (Volver), Judi Dench (Notas sobre um Escândalo), Meryl Streep (O Diabo Veste Prada) e Kate Winslet (Pecados Íntimos) pelo desempenho magistral no filme de Stephen Frears. Forest Whitaker, bom ator relegado a papéis de coadjuvante, não tinha grande visibilidade no cinema até personificar o medonho ex-ditador de Uganda Idi Amim em O Último Rei da Escócia. Saiu vitorioso, deixando para trás Leonardo DiCaprio (Diamante de Sangue), Will Smith (A Procura da Felicidade), o novato Ryan Gosling (Half Nelson) e o veteraníssimo - e dono de um Oscar honorário - Peter O´Toole, que nunca levou a estatueta de melhor ator, apesar de essa ter sido sua oitava indicação.




Martin Scorcese receberia a estatueta de melhor diretor pela qual esperava há tanto tempo, e que esse ano lhe era de direito. Ninguém apostava no contrário. Os Infiltrados se destacou nas premiações pré-Oscar, indicando que essa era a vez de Scorcese, um diretor incrível jamais premiado com a estatueta dourada, atropelado por Roman Polansky (O Pianista) em 2003 e por Clint Eastwood (Menina de Ouro) em 2005, só para lembrar o passado recente. E foi o momento mais emocionante da noite quando o trio Steven Spielberg, George Lucas e Francis Ford Coppola entregou o Oscar ao amigo. No palco, três enormes personalidades do cinema contemporâneo, homenageando uma quarta figura tão gigante quanto eles. Uma cena fundamental para história do Oscar, do Cinema e para qualquer um que se interesse por ambos.



O prêmio de melhor diretor de Martin Scorcese foi merecidíssimo. Os Infiltrados é um filme impecável. Ainda assim, eu apostava que ele levaria o Oscar de melhor filme menos por merecimento e mais pela velha iniciativa da Academia de corrigir injustiças. Não que tenha sido um Oscar injusto, não acho que seja o caso. Os Infiltrados não é uma das obras-primas do diretor, mas Scorcese realizou um filme irrepreensível, como eu já enfatizei. Nem por isso o melhor entre os 5 indicados. Minha paixão era Cartas de Iwo Jima, como também já deixei claro, e isso é uma opinião pessoal. Fiquei tentada a apostar minhas fichas nele, mas pensando racionalmente não acreditei que a Academia fosse novamente preterir Scorcese e oscarizar um filme de Clint Eastwood, que já venceu o amigo há dois anos atrás.
Babel ainda era apontado por muitos críticos como o favorito, e eu não via porquê, já que o filme de Iñarritu – o segundo melhor entre os concorrentes, na minha opinião – não mostrou bons resultados nas demais premiações, dando a entender que seria uma decepção no Oscar. A Rainha, britânico como é, nunca me pareceu ter chance de levar o prêmio principal. Por isso eu acreditava que a briga seria mesmo entre Pequena Miss Sunshine e Os Infiltrados. Sunshine acabou vencendo melhor ator coadjuvante, o que significou para mim que ele poderia, então, não levar o primeiro prêmio. O Oscar de melhor filme seria provavelmente de Os Infiltrados, que já havia ganho melhor diretor, roteiro adaptado e edição. E assim foi.




Os 5 indicados ao prêmio principal foram realmente os melhores de 2006 - e essa é mais uma opinião pessoal. Dizer isso pode parecer redundante, mas nem sempre concordo com as indicações. Em quase todos os anos há um ou outro filme que me desagrada. Dessa vez não foi o caso e fiquei feliz por isso. Em 2008, a Academia completará 80 anos e acho que podemos esperar uma grande festa. Com ótimos filmes, torço eu.

6 Comentários:

Às 8:37 PM , Anonymous Anônimo disse...

O texto ficou muito bem escrito, Isabella!

Bom, tenho minhas discordâncias, mas deixo elas para as minhas considerações pessoais em relação à festa.

Beijão!

 
Às 6:12 PM , Anonymous Anônimo disse...

boa cobertura! Torci por Miss Sunshine mas já fiquei muito feliz com o Oscar pelo roteiro original, não poderia ter sido outro. Agora quanto ao Scorcese bom, Lucas, Spielberg e Coppola dando um Oscar pra ele é muito coisa de compadre né não?
Gostei bastante do Oscar verde e foi uma surpresa aquela musica ter ganhado depois do Dremgirls das Bioncês Bezerrês Berrantês terem enchido o saco com 3 musicas indicadas! Pensei que a musica do doc não teria chance, e foi louco, mas achei importante o Oscar apoiar essa causa.
e a Gwyneth Paltrow tava linda demais!

ass: Caio

 
Às 9:04 PM , Blogger Isabella Goulart disse...

Spielberg, Lucas, Coppola e Scorcese são, numa piadinha cinematográfica meio tosca, "os bons companheiros".

"A Gwyneth Paltrow tava linda demais!". Depois dessa não precisava nem assinar a msg, né, Caio...

 
Às 1:11 AM , Blogger Dennis. disse...

claro q, como tá mto longo, eu não li tudo.
mas enfim, dos indicados a melhor filme eu só vi "a rainha". gostei bastante, mas enfim, não é ohhh. aliás, filme de oscar quase nunca é ohhh.
a coisa é q eu tenho q criticar é a jennifer hudson ser "boa o suficiente para o papel". qualé, mané. aqui na barra o q ela fez no filme se chama "bad, bad acting". como diria meu amigo zé wilker, pra ganhar ela, é melhor ganhar a garotinha, que tem mais conteúdo dramático.

bju!

 
Às 1:22 AM , Blogger Isabella Goulart disse...

Meu bem, EU tenho mais conteúdo dramático que a Jennifer Hudson! Eu, a poodle aqui de casa, um repolho... Com a vantagem de fazermos bem menos barulho que a moça lá. Ai, não fala, que eu tô com um trauma dessa mulher! Mas vamos combinar que pra um filme insuportável como Dreamgirls, a Jennifer Hudson é... ruim o suficiente. Não apodrece um filme que já está estragado.

 
Às 7:33 PM , Anonymous Anônimo disse...

Fico feliz e trite por Hudson ter levado atriz coadjuvante. Triste pq, do jeito que as coisas andam, numa sequencia Halle Barry-Jennifer Hudson, ano que vem Adam Sandler e Ashton Kutcher estão levando o Oscar. E feliz pq, se ATÉ ELA ganha, eu levo fácil..huhu

Bjus de uma Carol parcialmente surda dps da gritaria da msm Hudson e suas parceiras Dreamettes na cerimônia. Não é a toa que o Simon esculaxava ela, garota chata do kct...

 

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